sábado, 29 de outubro de 2011

Toda Criança é Especial!

A despeito de todos os esforços da psicologia, tentando convencer-nos de que somos seres "circunstânciais", ainda teimamos em ver o comportamento humano como fortemente determinado por um "EU" monolítico, coerente, regular e fortemente baseado na vontade para escolher os seus cursos de ação. A força de vontade, o querer ou não querer, é o único fator que move alguém em direção a algo, segundo a psicologia popular.
Quando se trata de analisar a nossa própria conduta, entretanto, a nossa folk psychology admite uma certa flexibilidade. Quando fazemos algo do qual não nos orgulhamos, costumamos recorrer a influências externas para justificar o "mau comportamento". Se deixássemos de utilizar dois pesos e duas medidas, e passássemos a enxergar as limitações de outrem com a mesma aceitação incondicional que destinamos às nossas, certamente passaríamos a agir mais solidariamente.
Faço essa pequena introdução, por que vejo a empatia como principal lição deste filme. A história de um garoto "endiabrado", começa a mudar quando alguém passa a se colocar no seu lugar. Alguém que, por já ter trilhado os mesmos caminhos de imcompreensão e insatisfação alheias com o seu modo de ser, considerado "desviante", pode compreender as angústias e necessidades desta criança.
Este alguém é o seu professor de artes. Um destes professores mágicos que o cinema de vez em quando cria, para nos lembrar que, apesar dos pezares, nós, os docentes, temos sim um certo encanto. Sua aparição no meio da trama, faz com que os olhares mudem em relação ao pequeno Ishaan, que nada mais é que um dos muitos alunos com dificuldades na aprendizagem não detectada nem pela escola nem pela família e que é visto apenas como um indisciplinado ou alguém que "não quer nada"!
Ao se ver inserido em um outro padrão de interações sociais, Ishaan passa a desenvolver habilidades de uma maneira totalmente inesperada para aqueles que não conseguiam percebê-lo de uma outra forma. Sua auto-imagem também muda! De um esboço descolorido e rasurado do seu irmão mais velho, sempre bem sucedido, Ishaan passa a se ver como uma obra única, com cores vivas e vibrantes a partir do olhar momentaneamente emprestado do seu professor...
Acho difícil olharmos para nossos alunos da mesma maneira após esse belíssimo filme!


domingo, 31 de julho de 2011

Cada um educa um!

Às vezes é difícil contornar o clichê da vida imitando a arte ou vice-versa. No caso do filme Preciosa: Uma história de esperança, não farei nenhum esforço para fugir a esta comparação. É certo, infelizmente, que a arte imita a vida, quando o roteiro traz o que ela tem de pior. Uma família completamente caótica, concentrando todas as mazelas que costumamos ver diluídas entre diversas outras famílias consideradas "apenas" desestruturadas. Desprezo, violência física, violência psicológica, violência sexual, gravidez precoce, falta de perspectiva, obesidade, exploração do trabalho, abandono intelectual, contaminação por HIV, etc. A """família""" (e ponha aspas nisso!!!) de Claireece Precious Jones, personagem principal da trama, ainda que representada quase todo o tempo por ela e pela mãe (os outros integrantes como o pai, a avó, a filha com síndrome de Down e o recém nascido Abdul, têm participação mais efêmera) pode ser considerada uma caricatura daquilo que permeia o imaginário popular sobre como é a vida de negros pobres. Uma caricatura que, obviamente, hipertrofia os aspectos negativos, reforçando o estereótipo de que desta situação, nada se aproveita.
A imitação da vida também aparece de maneira bastante "espelhada", quando o filme evidencia a incapacidade da escola regular para dar conta de sujeitos tão peculiares quanto a jovem Preciosa, que aos 16 anos, ainda não aprendeu a ler e escrever. Oxalá a imitação continuasse com a idéia sensata de que é necessário buscar outras alternativas (e não necessariamente uma "escola alternativa") quando alguém não se adapta ao sistema padronizado de educação. Já sabemos pelas ações de alguns movimentos sociais, comentados mais de uma vez neste blog (veja aqui e aqui ) que, modificar a maneira de educar para atender as reais necessidades daqueles que vivem em situação precária e de alto risco, não é mera ficção, é uma realidade evidente para a qual o nosso sistema educacional público fecha os olhos, e nossos professores se recusam a enxergar, quando persistem em culpar as famílias pelo fracasso escolar de seus alunos.
Imitemos a arte, por que quase sempre ela nos apresenta soluções preciosas... (Humpf! Além de clichê, trocadilho besta...)